quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Presença

Ele pensava ser difícil sair da vida de alguém, assim, como em contrariedade ao ditado popular, seria tirar um doce de criança.
 Pra ele não era, e nunca seria "fácil tirar doce de criança", visto que a consequência não fazia valer o ato.  
Era algo que, a curto, médio, ou longo prazo representaria uma perda pra quem o teve, e mais tarde o faria sentir-se em dívida -se não apenas com a criança, também com ele mesmo. Mas repensou, e achou que tratando-se de ir embora da vida de alguém, o contexto roubar doce de criança, não seria a melhor forma de explicar a sensação.
 Ficava cada vez mais longe de chegar a conclusão sobre qual seria a medida certa a tomar, tendo a solércia de querer provocar saudade, mas ao mesmo tempo, um tanto descrente de que a sua companhia pudesse ser o valor sólido de felicidade pra alguém. A linha tênue atormentando-lhe a cabeça: o que haveria entre o amor maduro e a necessidade de provocar saudade? Já começava a desconsiderar a existência dessa linha tênue, só de pensar em que diabos de 'amor maduro' seria viver um sentimento sustentado por memória, e imago? Pois é disso que a saudade vive.
 Ter um sentimento traduzido, pela imagem de alguém, carregada do valor afetivo que o outro lhe atribui, seria um tanto quanto reducionista ao se tratar de amor e de pessoas. Justamente porque,as pessoas são mais do que a nossa memória- e ideia- pode conferir sobre elas. De repente, ele sente com essa reflexão, aproximar-se de alguma resposta, algo talvez muito mais simples e menos taxativo, porém mais inusitado e difícil de encarar. Era aquela descoberta, de que o reforço contínuo de encontros favoreceria o encontro definitivo, enquanto que o interrompido o prorrogaria cada vez mais, tecendo-lhe uma ilusão de que a saudade alimenta o amor. Quando se ama por memórias, mais longe está de lidar com o real, não simplesmente porque as memórias em sua maioria exigem o mínimo de distância de contato, mas também por fazer da ausência uma medida de sentimento.
 O adiar do encontro definitivo, da convivência, do dia-a-dia, lado a lado, só faz da memória concebida pela abstinência, uma arte da fantasia. Quer dizer então que não tem essa de "eu gosto de ter saudade, pra tornar os reencontros mais intensos". Tem algo nela que você não aceita, e julga como impasse pra viverem sem o mínimo de distância. Assim fazendo o encontro definitivo, ou melhor dizendo: o amor, afastarem-se mediante a essa sombra, essa idealização de pessoa, essa ilusão. E foi essa a conclusão que o chocou. " É um choque, porque você nunca imagina que gostar de provocar ou de sentir saudade, desperte tanta ideia equivocada."
Ou que é ilusão pensar que a distância e a saudade alimentam um amor tanto quanto uma convivência. Depois de tudo isso, tentou fazer engate ao seu pensamento de antes, mas não conseguiu, porque amar compreende tudo, exceto gostar de distância. E também desistiu de ir embora daquela vida de quem amava, pois pra uma coisa a alusão que fez com o "roubar doce de criança" serviu. E foi pra enxergar, o quanto o ato de provocar saudade era inútil como aquilo. Um ato desmedido, pra uma recompensa, que seria tão mais certa se ficasse tudo como estava. Na presença.

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